quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Aborígine não se preocupa em ser feliz.

No final de 2020, como de costume, sempre recebo votos e saudações acerca do ano que finda. Sendo esse ano atípico e de reflexão profunda, em sua maior parte, dezembro parece catalisar uma força reflexiva ainda maior. Fala-se muito de fé, renovação, paz, saúde e principalmente felicidade. Respondi a uma dessas mensagens de um amigo, que me enviou um texto com uma apologia a felicidade. A resposta foi um pouco instintiva, expressada de forma impulsiva, sem que eu percebesse a profundidade dessas palavras rápidas que saíram do teclado do celular para o Whatsapp.

Assim caminha o Aborígine
Assim Caminha o Aborígine

 “se tem uma coisa que aprendi após a vivência na Century 21 foi que felicidade pra mim não é mais meta. Aliás, pra mim pouco importa. Meu foco na última década tem sido no autoconhecimento. Isso me trouxe alegrias e tristezas, bons e maus momentos, mas acima de tudo me trouxe uma liberdade extremamente prazerosa, a de viver dentro dos valores que minha autoconsciência revela. Não me pauto em fé, divindade ou outro tipo de inspiração metafísica. A astrofísica tem sido meu hobby e me levou a uma compreensão mais reconfortante do que sou e do que realmente faço parte. 2020 foi um excelente teste pra esse início de década. Sinto me confiante e procurando estar sempre atento aos caminhos diversos do autoconhecimento. obrigado pela reflexão. Espero abraçá-lo em breve.”

Dois✔✔ verdes mas sem resposta.

Sem perceber fiz um resumo do caminho que trilhei nos últimos 10 anos em breves linhas. Percebi que redes sociais, “coaches”, influenciadores digitais, associados a uma geração que acredita que ser feliz é meta, estão na contramão do que tenho trilhado. Talvez por isso já vinha em isolamento muito antes da pandemia, e os últimos meses me abraçaram como um reconfortante alento na forma desse distanciamento social semiobrigatório.
Não quero dizer que o Aborígine é contra a felicidade, pelo contrário, é muito a favor. A questão é não querer a felicidade como meta ou como estado de espírito perene. Na verdade encaro quase como uma ressignificação de felicidade.
Por mais paradoxal que pareça, o Aborígine é feliz mesmo em tempos ruins, mesmo diante do sofrimento, e não tem medo de que um sentimento de felicidade se acabe, mesmo porque entende que todo tempo bom é temporário. Felicidade ou ser feliz tornou-se uma obrigação, uma condição essencial para que alguém possa viver. Quando essa obrigação é constantemente frustrada, muitos se entregam a morte ou a alienação.
Não tenho que ser feliz, não preciso ser feliz, quero viver em constante aprendizado, constante integração com a natureza que me cerca. Isso tem um preço, pode trazer dor, decepção e as vezes um prolongado desalento. Mas o espírito nômade do Aborígine enfrenta isso, caminhando, aprendendo, sofrendo, conhecendo-se e buscando integrar-se com o mundo natural a sua volta. Olhando de fora parece uma vida sofrida, mas no âmago ele sabe que é o melhor caminho que poderia seguir pra terminar sua jornada de forma plena. Muitas vezes um rosto sofrido e cheio de cicatrizes é o que traz muitos momentos inspiradores e de felicidade plena. 


Leve na mala: seu próprio conceito de felicidade.